segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Heróica.

Foi quando ouvi meu tio-avô dizer que nenhum poeta sabia amar. Enquanto o rádio chiava em alguma frequência de ondas curtas que só se escuta no litoral gaúcho, entre os goles curtos do seu café mais amargo que de costume, deixou escapar uma verdade inconveniente aos meus ouvidos de criança. Tinha meus treze anos ainda incompletos, os cabelos não chegavam aos ombros, rabiscava meias-verdades em folhas de rascunho, andava descalça em calçada de paralelepípedo, tinha o rosto queimado do sol e o coração inocente demais. Quando completei quatorze anos ele morreu. Não chorei lágrimas e não tive escolhas, mal o conhecia. Aos quinze larguei a poesia, e parti pra prosa. Os cacos do coração eu juntei aos desesseis. Como dizia aquele velho, era doce demais para não saber amar. Inconsequentemente, nem tudo o vento levou. Larguei a poesia, mas ainda levo minha vida em rimas pobres e estrofes decassilábicas. Mas quando falam sobre saber amar alguém, ainda tenho lá minhas dúvidas...

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Chega de saudade?

Foi quando a Manu disse, no meio de todas aquelas escolhas sem sentido tanto pra mim quanto pra ela, que sentia saudade de alguém. Não muito essas palavras tinham saído de dentro dela e a minha face expressava o quão apertado o meu coração se encontrava naquele instante. Eu disse algumas coisas, ela completou dizendo que tinha até vergonha de falar sobre saudade perto de mim, perto do que eu sentia. Disse que não precisava se sentir assim, que nenhuma saudade é injusta. Daí eu lembrei de alguns pensamentos que eu tenho antes de dormir, fiquei pensando na mudança que tinha acontecido com isso que eu chamo de saudade nos últimos tempos e sorri um pouco sem graça enquanto o coração apertava.
A saudade não escolhe quando aparece, isso é certo e eu sou grande testemunha. Ela chega de mansinho ou arrastando o que vê pelo chão, mas sempre chega e demora pra ir embora. E quando chega, a ausência faz silêncio de forma quase constante.
Depois disso eu me distraí um pouco, falei sobre a vida, sobre ao casos e as lembranças de sempre; pude adocicar a tarde de uma sexta que mais parecia segunda-feira com balas sete belo gigantes e coca-colas que não me desceram tão doces. Até isso fez a saudade apertar no meu peito, por causa da péssima mania de guardar lixinhos alheios.
Voltando pra casa, no ônibus com o sol batendo no rosto, eu me perguntava quantas e quantas vezes a saudade tinha tomado conta do meu pensamento em horas como aquela. Lembrei de quando eu ligava rapidinho só pra dar oi, então escrevi o que eu precisaba numa mensagem e mandei pra não esquecer. Logo depois a bateria do celular acabou, como se resistisse arduamente até este momento e só.
É No fim de tarde que meu coração fica mais apertado e há quem saiba exatamente o motivo e a razão. Não questionava a saudade, eu me perguntava até quando o meu pensamento seria assim tão bem habitado. Suspeito que não haja resposta, ou seilá.
Até agora nada acalmou esse meu coração desde o final da tarde. Escrevi tudo, tudinho o que eu pude dizer publicamente e agora corro o risco de não postar mais nada. Lembro da Manu loirinha e baixinha me olhando com os dois olhos azuis cheios de saudade, queria (como ela) poder dizer pra alguém que eu sinto saudades de alguém. Alguém que não saiba disso e não veja em mim o que transborda do peito pelhos olhos, mas é impossível. Queria dizer isso tudo pra alguém que não ache que sentir saudade é uma bobagem ou pense que passa de acordo com nosso querer. Não passa tão rápido assim.
Como eu escrevi uma vez, eu só queria que algo me provasse que eu estaria pensando nele na mesma frequência com que ele pensaria em mim. Algo que me provasse que a nossa sincronia de pensamento mesmo longe não deixava de existir. Mais nada.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Eu te espero, era o que costumava dizer sempre. Não importando muito a que distância estivesse, se o tempo passaria, se tinha compromisso ou hora pra chegar em casa. Era o que sempre dizia a quem pedia pra que ficasse um pouquinho mais, pra quem queria guardar um pouquinho mais daquelas boas lembranças na memória ou então, pra quem queria crer em algo mais concreto do que apenas em boas recordações. Costumava esperar, sempre. Hoje, mesmo sabendo que são poucas as coisas que valem realmente à pena esperar, não prenuncia com tanta frequência esse verbo nem pras coisas pequenas e poucas.
Na última despedida, mais ou menos um mês atrás, não quis dizer e não disse que esperaria. Sabia que o tempo não esperaria por ela, nem por ninguém. Talvez por isso só tenha dito que voltaria. Eu vou voltar, disse enquanto fazia um último abraço demorar um pouco mais pra acabar. Disse que voltaria, talvez porque agora acreditasse que os dois durariam mais um pouco. Talvez porque essa fosse a primeira despedida, entre as outras tantas, em que ambos acreditavam na volta. Mesmo sabendo tudo um dia acaba, mas acreditavam que voltasse ao menos pra dizer que não voltaria novamente ou, então, que nunca esperou que um caso ao acaso esperasse tanto pra não acabar.


"Um dia, ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar /
Olhou-a de um jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar / E não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falar / E nem deixou-a só num canto, pra seu grande espanto, convidou-a pra rodar / E então ela se fez bonita como há muito tempo não queria ousar / Com seu vestido decotado cheirando a guardado de tanto esperar / Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se usava dar / E cheios de ternura e graça, foram para a praça e começaram a se abraçar / E ali dançaram tanta dança que a vizinhança toda despertou / E foi tanta felicidade que toda cidade se iluminou / E foram tantos beijos loucos, tantos gritos roucos como não se ouvia mais / Que o mundo compreendeu / E o dia amanheceu
Em paz
"

[ Valsinha | ChicoBuarque ]

sábado, 23 de agosto de 2008

Café II

Diz ele que gosta de café fraco. Diz que o que eu faço é do agrado dele e que não se importa muito se eu erro o ponto, se deixo forte demais em um dia ou fraco demais no dia seguinte, se é fresco hoje e não é amanhã. Diz ele que assim tá de bom grado, que antes eu erre o ponto do que não faça o café.

O fraco e pouco doce dele até combina com o meu, que é descafeínado.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Café.

Chega em casa meio-cedo-meio-tarde, é uma corriqueira terça-feira, a tarde já tarda, já passa das cinco (hora do chá), queria que fosse mais cedo, queria que fosse mais quente. Já antes de abrir a porta, sente o cheiro de café fresco vindo da cozinha, cortando a sala de jantar sem mais escalas até seu olfato pouco aguçado e só sente o cheiro porque os dias úmidos tem os cheiros mais intensos. Mas não só por isso sente o cheiro, sente porque sabe que, mesmo longe de si, as probabilidades daquele ele estar tomando café agora são extremamente altas. Sente, porque a ausência constante é presente no pensamento de forma constante também. Sente não apenas isso, sente também alegria ao sentir o cheiro de café fresco. Sente a visita quem sabe recíproca na mente alheia, sente ainda o abraço forte e a força do vento de lá. Sente o cheiro do café, e já sente a enxaqueca que o café provocaria caso tomasse toda a cafeína que não bebe há dois anos.
Já do lado de dentro da porta e sem a chave na fechadura, descalça o sapato de cada pé com a ajuda do outro enquanto o chaveiro chacoalha. Joga a mochila estampada de bottons em um canto da sala enquanto se pergunta se o café dela condiz com o dele, se é do seu agrado, se falta açúcar ou se não parece tão fresco assim. Não que saiba fazer café, apenas gostaria de saber do gosto alheio, saber se ele beberia o café que ela nunca fizera porque esquecera da água fervida no fogão.
Forte ou fraco? Simples assim.
Um gosto apenas. Mais um gosto bom da vida que depois de um tempo enjoa, como muitas outras coisas. Pena que nem tudo é tão simples assim, para se desdizer e se desdenhar depois de certo tempo.

Talvez acerte o café do agrado dele. Sem muito açúcar, porque enjoa, né?