sábado, 1 de novembro de 2008

POR TRÁS DA VIDRAÇA

Sonhei que você sonhava comigo. Mais tarde, talvez eu até ficasse confuso, sem saber ao certo se fui eu mesmo quem sonhou que você sonhava comigo, ou ao contrário, foi quem sabe você quem sonhou que eu sonhava com você. Não sei o que seria mais provável. Você sabe, nessa história de sonhos — falo o óbvio —, nunca há muita lógica nem coerência. Além disso, ainda que um de nós dois ou os dois tivéssemos realmente sonhado que um sonhava com o outro, também é pouco provável que falássemos sobre isso.


-Caio Fernando Abreu-
Assim como o Caio Fernando Abreu, que já me tirou tantas vezes a sensatez e o sono, também me pergunto por que, raios, a gente tem que partir. Partir sem saber, mesmo com tantas e tantas evidencias, se tudo isso é realmente amor ou não. Sem saber porque a minha insegurança me priva de achar respostas e razões para o amor, mesmo ele sendo irracional. Partir e ao mesmo tempo ficar, e mesmo assim não achar nenhuma resposta, tampouco explicação. Partir à procura do porto-segura, da ilha perdida; à procura da resposta mais que óbvia e que mesmo assim não vejo e não compreendo.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

(...)Tem sempre alguém achando um absurdo eu escrever sem usar os “lhes” e “los” e outras firulas. Meu português simples e direto e sem os mares assoviados que planam na planagem dos assovios que se perdem no trilho do trem assolado. Tem sempre alguém achando um absurdo eu não saber o que disse aquele filósofo ou poeta ou colunista de revista gringa. Tem sempre alguém me comparando com as histéricas “dadeiras”, com as discípulas dos beatniks que vivem “pra caralho, meu”, as doidinhas que largaram tudo pra “super viver a vida, cara”, as blogueiras que contam do dia com fotinhos para ilustrar, as traças que vivem de livros e drogas pra descobrir o que pensar da vida ou sei lá mais o quê de desgraça se pode encontrar por esses bares de gente que faz sarau ou simplesmente faz mais melhores amigos.
E achando um absurdo erros de português. E imperdoável eu não falar outras línguas. E que eu deveria conhecer mais o mundo. E que eu deveria falar dos outros. E que eu deveria falar menos de mim. E que eu deveria, deveria, deveria. Tem sempre alguém reclamando de ter virado personagem da minha vida. E reclamando de nunca ter virado nada. Tem sempre alguém reclamando que é muito triste, que é muito pesado, que é muito bobinho, que é escatológico, que é muito adolescente, que é muito puro, que tem muita bandalhera, que é velho demais pra minha idade, que sempre fala a mesma coisa, que não diz coisa com coisa, que incomoda, que não causa nada, que me expõe demais, que me protege, que diz tudo sobre mim, que não diz nada. Tem sempre alguém chegando e indo embora por causa de mim. Atraído, espantado, enojado, louco, excitado.(...)


Trecho Editado de: Mundo Pequeno | Tati Bernardi

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

O artista rabisca, na folha branca, a arte da vida e sem borracha erra os traços. Deixa as marcas do seu traçado, mas segue adiante. A vida segue em cada canto, em cada instante. De repente se repete em outras folhas brancas os mesmos traços, com erros diferentes dos de então, ou traços diferentes com rumos semelhantes. Com o passar do tempo se faz os mesmos erros em traços distintos. A folha branca, límpida, é a incerteza do futuro. Viver é rabiscar forte na folha branca. Eu rabisco forte e percebo que já não faria o traço da mesma forma. Passam-se os instantes, faz-se os traços e ficam as marcas. Assim como vão-se os anéis e ficam os dedos.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Primaveras de Outubro

amanheço mais mulher e menos menina a cada dia. amanhã amanheço minhas dezeseis primaveras e dezeseis invernos também, amanheço dezesseis verões, dezesseis carnavais e dezesseis outonos que vão e vêm. amanheço mil pássaros cantando e mil sóis se pondo, e mais da metade eu não vi. amanheço quase tudo alegria e (quase) todos os meus (des)amores.
amanheço as dezesseis velinhas dos tantos bolos que me fizeram doce nesses dezesseis aninhos. amanheço dezesseis mil sonhos, amanheço céus de blues e nuvens brancas pelos olhos, amanheço as mil e uma cores da camiseta listrada e do chinelo de borracha.

amanheço mais menina e menos mulher, mesmo estando mais perto dos vinte e mais longe da dos dez. não amanheço meio termo mas amanheço incertezas, sorrisos e palavras. amanheço passageira, mas inteira. amanheço minha longa estrada pouco andada, amanheço meus quilômetros a pé e todos os meus sonhos.amanheço meu subjetivo infinito em um metro e cinquenta e nove centímetros de altura. amanheço minha identidade maior que meu pé tamanho trinta e quatro.

amanheço dezesseis datas repetidas, dezesseis comemorações do acaso seguidas de mais mil e um milhão. amanheço um ano a mais, amanheço contagem regressiva, trezentos e cinquenta e cinco dias, mais uma vez. amanheço mais sincera, mais vivida, mais perdida e mais achada. amanheço mais um dia, outro dia, mais um mês, outro mês, outro ano, mais um ano.

- dezesseis anos, parabéns, feliz aniversário!

amanheço nesses meus quase dessezeis anos, não a soma dos meus anos, mas a medida das alegrias e tristezas da minha vida.