segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

de como é fácil rir do teu lado

(Reli algumas postagens antigas, lembrei de alguns momentos...)

Foi assim que me dei conta que foi tu quem esteve comigo nos momentos mais felizes que eu tenho tido,

...

Perto, mesmo longe.

Quero falar de nós, se mais de mim ou de ti, isso tanto faz. Tua falta é cada vez mais presente por aqui ou por tudo que chamo de meu. Nesses dias quentes, saio do banho e ando pela casa de calcinha e blusa e imagino talvez o que tu iria me dizer. Ia rir com teu jeito único de fazê-lo, provavelmente, ou observar o quanto me sinto a vontade contigo.
Como se tua voz viesse até mim, atravessando nossos quilômetros de distância, escuto baixinho e sussurrado o tom grave no meu pescoço que me diz 'mulher, como tu tá cheirosa'. São coisas bonitas, simples mas bonitas. Talvez bobas. Mas que me fazem agradecer por nossos quilômetros serem apenas de distância. Como num passe de mágica é do meu lado que tu estás completando o encaixe de um abraço até eu abrir meus olhos de novo.
É assim que gosto de te ter: perto, mesmo longe.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Vinte e três horas e sempre penso em ti. Mesmo horário, sempre sempre. Espero mais meia hora, vinte e três e trinta e sei que logo logo você chega, logo logo o telefone toca. Espero como quem espera o sol nascer, uma flor desabrochar. Daqui uns dias tudo isso faz mais sentido, eu juro. Até lá: espero, imaginando que a flor que desabrocha é meu sorriso quando corro pra te ter de novo.
Até lá conto os minutos até chegar a hora do meu dia em que eu sou só tua, sem intervenções. Minha constante espera é pra ser tua de novo, pra ser a tua "o que quiseres que eu seja" - se é que me entendes...- independente da hora do dia. Enquanto não sou tua do teu lado, espero. Um dia tudo isso faz mais sentido, eu sei.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Enfim, minhas aulas acabaram. Seria fácil pensar que é simples assim, mas não consigo por em palavras devido a quantidade de coisas que esse fim carrega junto. Sempre fui chorona, mesmo quando me fingia de forte; agora, me finjo de chorona pra ser mais forte do que tento ser. Fato é que até agora não chorei por isso, talvez porque pra mim a época de escola já havia começado a acabar há alguns meses. Além disso, sabia que precisava ser forte e enfrentar de frente as coisas quando elas chegassem. Porque elas sempre chegam, alheias ao nosso querer ou não.
Para alguns, essa fase que termina é uma determinação de que é necessário crescer, que a adolescência termina, e que além desse crescimento é necessário se desprender de certas afetividades e perceber quem é de verdade ou não. Mais do que tudo isso, é uma fase para descobrir a si mesmo.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

por Clarice Lispector

Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa...
Não altera em nada porque no fundo a gente não está querendo alterar nada.
A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

todo carnaval tem seu fim

Veja, meu bem,
abre teus olhos
pois o fim sempre chega,
mesmo sem parecer fim

- pode ser início -

A perspectiva de fim é a gente que dá
depois que passa...

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Virei a cara pra uma porção de pessoas conhecidas hoje de tarde pra simplesmente não ter que ouvir aquela porção de perguntas indesejáveis de conveniência. Culpei o calor, mas o fato é que hoje deixei um pouco da simpatia de lado e preferi me esconder.
Preferi deixar de lado o que eu era no tempo que convivia com essas pessoas; virei o rosto pra mostrar que mudei, mesmo não tendo mudado quase nada em dois anos. É esquisito, culpei o calor. Mas mais esquisito do que isso, é ver que tu mudou tanto por dentro enquanto muita coisa e gente, continua sempre igual. Por dentro, e mais ainda por fora.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Foi então que aquela voz que vem bem das entranhas da mente disse que eu precisava parar de me preocupar com os outros, parar de me preocupar com o problema dos outros, e por uma ordem no meu caos, não nos alheios. Ninguém se preocupa em organizar minha bagunça mental, em encaixotar e etiquetar meus sentimentos, ninguém. Ou quase ninguém, porque se eu pensar um pouco percebo que muita gente ajuda a me deixar menos caótica um pouco.
O final do ano vai chegando e começo a pensar em tudo que devia ter feito e não fiz, desde o com licença que não dei no onibus lotado até as coisas que fiquei devendo pra uma porção de gente e pra mim mesma também. Acho que preciso de férias, férias sossegadas no meu refúgio... O sossego vai ficar pra mais tarde, eu sei, mas sei também que em breve elas chegam. Até lá boto meu mundo em ordem, dou mais atenção pro que gosto e pra mim, vejo o que deixei pra trás e anseio de olhos fechados o que vem pela frente. A voz se cala, uma música calminha toca por aqui. Enfim, acho que as coisas começam a se ajeitar, mesmo eu não sabendo muito bem por onde. Enquanto deixo uma parte de mim pra trás, outras eu não consigo ver o fim tão cedo.

sábado, 7 de novembro de 2009

Summertime

Hush, baby, baby, baby, baby, baby,
No, no, no, no, don't you cry.
Don't you cry!

One of these mornings
You're gonna rise, rise up singing,
You're gonna spread your wings,
Child, and take, take to the sky,
Lord, the sky.

Until that morning
Honey, n-n-nothing's going to harm you now,
No, no, no, no, no, no, no, no, no,
Don't you cry,
Don't you cry,
Cry.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Nessa Vida | Locomotores

...
Se quiser viver feliz comigo
Eu faço valer a pena
Esperando o sol nascer
Falando sobre coisas boas
Escolher um som, cantar
Andar pela casa sem roupa


Amando sem fazer de conta
Querendo porque vai dar conta

Amando sem fazer de conta
Querendo porque vai dar conta
...

terça-feira, 3 de novembro de 2009

meu refúgio

Voltar pra perto de ti de tempos em tempos tem sido meu refúgio da rotina dessa vida sem muitas cores. Saber que posso voltar e que quando eu voltar terei o mesmo carinho entre teus braços é o que conforta a minha (grande) saudade. Se hoje as coisas são tão boas assim entre a gente é, porque, de alguma maneira, as várias dúvidas que eu tinha foram deram lugar a certezas, e sei que isso vale pra ti também. Ao contrário de tudo que podia ter sido e não foi, vejo nós dois cada vez mais próximos, cada vez mais felizes, cada vez mais juntos. E sinceramente não quero nem consigo nos imaginar de outra maneira.
Mesmo sendo muitas as coisas que eu sequer imaginava serem possíveis do teu lado, ainda não entendo muito bem como nós dois continuamos imunes ao tempo; muito menos como eu caibo tão perfeitamente junto a ti numa rede no sereno ou numa cama pequena numa tarde quente de novembro. Queria entender, mas nem mesmo quanto tento explicar o que sinto encontro uma resposta. O que chega bem perto é dizer quanto te amo.

sábado, 26 de setembro de 2009

há muito tempo que não escuto nada de novo

a mesma trilha sonora com o mesmo fim
não é hora de ouvir ska,
mas também não vou caminhando
até a rua Santo Inácio,
mesmo não querendo parar de andar,

pra lá e pra cá
pó pelos olhos e em todos os móveis da casa; final de setembro, calor primaveril e polém de flores nas narinas rosadinhas; espirro no silêncio.

passa o tempo, sopra o vento,
mudam as cores, renascem as flores

verão, outono, inverno, primavera e
verão.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

saudade



A luz
a paz da voz a voz em mim
é o amor que conduz e traz aqui
e diz som em nós e não tem fim.

O céu, o ar
o azul do azul daqui desse mar
desse chão
sertão de não terminar
se inundou coração.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

a distância escrita nos mapas não diz toda a verdade, mas também não mente
mesmo sendo menor do que aquela distância que se sente, ela ainda existe.

dói menos, é claro; mas, de certa forma, sempre agradeço por ser assim e não assado.

algumas coisas não consigo muito bem explicar,
ou, então, prefiro que não tenham alguma explicação

gosto mais assim; é mais bonito pensar que, mesmo longe, estamos sempre sincronizados

algo que me ajuda a entender meu pensamento perto de ti todas as noites enquanto durmo inconsciente

ou outras coisas como o momento de agora:

olho as horas, o celular toca longe de mim e não tenho dúvidas que és tu, sempre tu
no rádio toca qualquer canção que não me toca

simplesmente não sei, não ouço;
a canção toca, não me toca
e acaba.

poderia ser the smiths, the doors, the ramones, the libertines, the strokes, the smashing pumpkins, the killers, the cure, ou qualquer outro dos vários 'the' vindo de ti ou ligado a ti

mas não é.

o pensamento longe daqui é que fica ligado em ti
tem sido sempre assim,
bem mais perto do que os nossos quilômetros indicam.

dissimulo a realidade, os momentos
e te sinto muito perto, mesmo longe.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

o que a distância e o tempo sempre desconsideram...

Então, como falta muito pouco agora e mais umas ou outras razões que são minhas mas que desconheço (sempre ligadas a ansiedade, é claro), essa questão de horas faz começar a surgir em mim esses arrepios - aqueles mesmos que brotam da pele quando me junto a ti.
No relógio o tempo não passa, deveria dormir pra que o tempo soprasse mais rápido, mas sei bem o que habitaria meus pensamentos antes de dormir. Diferente das razões os pensamentos eu conheço bem, desde o dia que meia dúzia de palavras no meio da rua nos uniram. Lembro que pediste pra que eu ficasse, não fiquei. O que realmente não sabes (mas, como te conheço um pouco, sei que desconfias muito bem) é que ficaste em mim desde então. Ficaste e sempre volta, assim como eu espero ter ficado e como tu diz que eu volto mesmo nunca tendo saído. Volta nos pensamentos, nas palavras, nos sentidos, nas razões e até no que desconheço. Volta, mesmo longe. Volta, como sempre digo que vou voltar quando nos despedimos. Já começo a me sentir mais completa um pouco, entre outras coisas mais. E os arrepios cada vez mais frequentes, desconsiderando o que achamos tão absurdo...

quinta-feira, 30 de julho de 2009

domingo, 14 de junho de 2009


Comecei a sentir frio quando entraste no ônibus, mas não por causa dessa brisa invernal de Porto Alegre, e sim pela falta do teu corpo, das tuas mãos, do teu aconchego. Depois que nos despedimos, eu ainda fiquei te olhando subir a escada do ônibus na esperança que voltasse e me dissesse que amanhã também estaria aqui, e que desfizesse toda a tua mala. Besteira minha pensar que adiando tua volta e desfazendo tua mala, suspenderia tua ausência. Momentâneamente, talvez; mas não, dessa vez dissimulei. Quando sentaste na poltrona 14 ou 15 (não lembro, pois fiz questão de não atentar detalhes) olhei para o meu lado direito, mesmo sabendo que não estarias ali. Mas sabia que me olhavas, seja por trás do vidro fumê que nos separava ou independente de onde estivessemos.

Somente quando o ônibus partiu, pude então entender:
frio é ausência de calor.

terça-feira, 28 de julho de 2009

do que é meu ou nosso

Aí, me veio uma lembrança bonita de um beco forrado de jacarandás que terminava numa escadaria por onde não passo mais. Tive a impressão de caminhar lá contigo. Só que nesse tempo, nem sonhava com tua existência..
Primeiro, achei engraçado. Depois, triste. Não é justo roubar lembranças que não são tuas. Não é.
O presente já é tão grande e tão intenso; o presente é tão tão teu. O antes não. O antes não compartilho e não associo a nossa vivacidade sutil.
Ainda não aprendi a separar o que é só meu, do que é teu e do que é nosso. Ainda não sei dizer à partir de que ponto tu começaste a fazer parte das minhas lembranças, do meu presente. É assim que crio uma descronologia na minha cabeça, que nem eu entendo, muito menos saberia explicar... Mas sei que tu entendes muito bem.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

detalhes

se outro cabeludo
aparecer na minha rua
e isto me trouxer
saudades tuas
saiba que a culpa
é toda sua, sim...

quarta-feira, 10 de junho de 2009

é dia de te ver, que sorte grande, sim senhor...
é mamão no mel, algodão doce azul
e é bom, acende uma alegria tipo curumim
por causa do que vibra dentro de você
você não tem idéia como sou feliz
às cinco eu passo aí para um sorvete
levo o disco do Bob que você me pediu
e aí... a gente vai passear
e aí... a gente vai namorar
e depois... e depois... e depois...


_
e depois | seu jorge

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Gracinha,todo mundo tem um ponto fraco
você é o meu, por que não?


_
Ponto Fraco | Cazuza

domingo, 3 de maio de 2009

lua adversa - cecília meireles

tenho fases, como a lua.
fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
perdição da minha vida!
tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

fases que vão e que vêm
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

e roda a melancolia
seu interminável fuso!
não me encontro com ninguém
(tenho fases, como a lua)

no dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
e, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...

_

nem tudo é tão oposto e adverso assim em mim, mas tenho tido fases. fases de superautoproteção, de uma inseguraça um tanto quanto boba. tenho precisado de carinho e de certezas constantes, de respostas pras minhas dúvidas e de coisas bobas pra secar o choro e fazer brotar um sorriso por aqui. tenho tido medo e confiança, confiança e medo, tudo obra de nada menos que eu mesma.
tenho tido fases, mas continuo bem, muito bem. digo por aí que ninguém tinha me feito tão feliz durante tanto tempo, e é verdade. mas, independente disso, tenho tido fases de sorrir feito boba e de chorar baixinho pela saudade que não cessa. e de todas as minhas fases, é isso que se mantém intocável, em volta de lembranças coloridas.

sábado, 2 de maio de 2009

Frágil você tem tanta vontade de chorar, tanta vontade de ir embora. Para que o protejam, para que sintam falta. Tanta vontade de viajar para bem longe, romper todos os laços, sem deixar endereço. Um dia mandará um cartão-postal de algum lugar improvável. Bali, Madagascar, Sumatra. Escreverá: penso em você. Deve ser bonito, mesmo melancólico, alguém que se foi pensar em você num lugar improvável como esse. Você se comove com o que não acontece, você sente frio e medo. Parado atrás da vidraça, olhando a chuva que, aos poucos, começa a passar.
_
caio f.



tudo passa. das minhas chuvas internas com os seus respectivos vazamentos, até os para todo sempre.
mas tem algo aqui que não vai passar, que é mais forte do que eu, e que não quero me afastar, que não sei explicar como ou quando foi, mas que veio. e que ficou.

domingo, 12 de abril de 2009

Quando partiu, levava as mãos no bolso, a cabeça erguida. Não olhava para trás, porque olhar para trás era uma maneira de ficar num pedaço qualquer para partir incompleto, ficado em meio para trás. Não olhava, pois, e pois não ficava. Completo, partiu. (Caio Fernando Abreu)

porém eu olhava, e sempre olho para trás, de relance, esperando não ser vista por nada nem ninguém, muito menos por ti. sabe-se lá o que tu pensarias de mim olhando pra trás nas altas da madrugada, olhando teu jeito de andar, talvez, ou esperando que fizesses o mesmo que eu: simplesmente olhasse, para trás.
mas sempre, inevitavelmente sempre, sempre olho para trás porque, em mim, mais da metade fica e o resto volta comigo. sempre. mesmo eu me achando grandinha demais pra usar palavras como sempre ou nunca. independente disso e de outras coisas casuais sempre, sempre olhei pra trás e nunca, nunca gostei de despedidas.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

para uma avenca partindo - caio f.

Olha, antes do ônibus partir eu tenho uma porção de coisas pra te dizer, dessas coisas assim que não se dizem costumeiramente, sabe, dessas coisas tão difíceis de serem ditas que geralmente ficam caladas, porque nunca se sabe nem como serão ditas nem como serão ouvidas, compreende? Olha, falta muito pouco tempo, e se eu não te disser agora talvez não diga nunca mais, porque tanto eu como você sentiremos uma falta enorme dessas coisas, e se elas não chegarem a ser ditas nem eu nem você nos sentiremos satisfeitos com tudo que existimos, porque elas não foram existidas completamente, entende, porque as vivemos apenas naquela dimensão em que é permitido viver, não, não é isso que eu quero dizer, não existe uma dimensão permitida e uma outra proibida, indevassável, não me entenda mal, mas é que a gente tem tanto medo de penetrar naquilo que não sabe se terá coragem de viver, no mais fundo, eu quero dizer, é isso mesmo, você está acompanhando meu raciocínio? Falava do mais fundo, desse que existe em você, em mim, em todos esses outros com suas malas, suas bolsas, suas maçãs, não, não sei porque todo mundo compra maçãs antes de viajar, nunca tinha pensado nisso, por favor, não me interrompa, realmente não sei, existem coisas que a gente ainda não pensou, que a gente talvez nunca pense, eu, por exemplo, nunca pensei que houvesse alguma coisa a dizer além de tudo o que já foi dito, ou melhor pensei sim, não, pensar propriamente dito não, mas eu sabia, é verdade que eu sabia, que havia uma outra coisa atrás e além das nossas mãos dadas, dos nossos corpos nus, eu dentro de você, e mesmo atrás dos silêncios, aqueles silêncios saciados, quando a gente descobria alguma coisa pequena para observar, um fio de luz coado pela janela, um latido de cão no meio da noite, você sabe que eu não falaria dessas coisas se não tivesse a certeza de que você sentia o mesmo que eu a respeito dos fios de luz, dos latidos de cães, é, eu não falaria, uma vez eu disse que a nossa diferença fundamental é que você era capaz apenas de viver as superfícies, enquanto eu era capaz de ir ao mais fundo, você riu porque eu dizia que não era cantando desvairadamente até ficar rouca que você ia conseguir saber alguma coisa a respeito de si própria, mas sabe, você tinha razão em rir daquele jeito porque eu também não tinha me dado conta de que enquanto ia dizendo aquelas coisas eu também cantava desvairadamente até ficar rouco, o que eu quero dizer é que nós dois cantamos desvairadamente até agora sem nos darmos contas, é por isso que estou tão rouco assim, não, não é dessa coisa de garganta que falo, é de uma outra de dentro, entende? Por favor, não ria dessa maneira nem fique consultando o relógio o tempo todo, não é preciso, deixa eu te dizer antes que o ônibus parta que você cresceu em mim de um jeito completamente insuspeitado, assim como se você fosse apenas uma semente e eu plantasse você esperando ver uma plantinha qualquer, pequena, rala, uma avenca, talvez samambaia, no máximo uma roseira, é, não estou sendo agressivo não, esperava de você apenas coisas assim, avenca, samambaia, roseira, mas nunca, em nenhum momento essa coisa enorme que me obrigou a abrir todas as janelas, e depois as portas, e pouco a pouco derrubar todas as paredes e arrancar o telhado para que você crescesse livremente, você não cresceria se eu a mantivesse presa num pequeno vaso, eu compreendi a tempo que você precisava de muito espaço, claro, claro que eu compro uma revista pra você, eu sei, é bom ler durante a viagem, embora eu prefira ficar olhando pela janela e pensando coisas, estas mesmas coisas que estou tentando dizer a você sem conseguir, por favor, me ajuda, senão vai ser muito tarde, daqui a pouco não vai mais ser possível, e se eu não disser tudo não poderei nem dizer e nem fazer mais nada, é preciso que a gente tente de todas as maneiras, é o que estou fazendo, sim, esta é minha última tentativa, olha, é bom você pegar sua passagem, porque você sempre perde tudo nessa sua bolsa, não sei como é que você consegue, é bom você ficar com ela na mão para evitar qualquer atraso, sim, é bom evitar os atrasos, mas agora escuta: eu queria te dizer uma porção de coisas, de uma porção de noites, ou tardes, ou manhãs, não importa a cor, é, a cor, o tempo é só uma questão de cor não é? Por isso não importa, eu queria era te dizer dessas vezes em que eu te deixava e depois saía sozinho, pensando também nas coisas que eu não ia te dizer, porque existem coisas terríveis, eu me perguntava se você era capaz de ouvir, sim, era preciso estar disponível para ouvi-las, disponível em relação a quê? Não sei, não me interrompa agora que estou quase conseguindo, disponível só, não é uma palavra bonita? Sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver, e desamar era não mais conseguir ver, entende? Dolorido-colorido, estou repetindo devagar para que você possa compreender, melhor, claro que eu dou um cigarro pra você, não, ainda não, faltam uns cinco minutos, eu sei que não devia fumar tanto, é eu sei que os meus dentes estão ficando escuros, e essa tosse intolerável, você acha mesmo a minha tosse intolerável? Eu estava dizendo, o que é mesmo que eu estava dizendo? Ah: sabe, entre duas pessoas essas coisas sempre devem ser ditas, o fato de você achar minha tosse intolerável, por exemplo, eu poderia me aprofundar nisso e concluir que você não gosta de mim o suficiente, porque se você gostasse, gostaria também da minha tosse, dos meus dentes escuros, mas não aprofundando não concluo nada, fico só querendo te dizer de como eu te esperava quando a gente marcava qualquer coisa, de como eu olhava o relógio e andava de lá pra cá sem pensar definidamente e nada, mas não, não é isso, eu ainda queria chegar mais perto daquilo que está lá no centro e que um dia destes eu descobri existindo, porque eu nem supunha que existisse, acho que foi o fato de você partir que me fez descobrir tantas coisas, espera um pouco, eu vou te dizer de todas as coisas, é por isso que estou falando, fecha a revista, por favor, olha, se você não prestar muita atenção você não vai conseguir entender nada, sei, sei, eu também gosto muito do Peter Fonda, mas isso agora não tem nenhuma importância, é fundamental que você escute todas as palavras, todas, e não fique tentando descobrir sentidos ocultos por trás do que estou dizendo, sim, eu reconheço que muitas vezes falei por metáforas, e que é chatíssimo falar por metáforas, pelo menos para quem ouve, e depois, você sabe, eu sempre tive essa preocupação idiota de dizer apenas coisas que não ferissem, está bem, eu espero aqui do lado da janela, é melhor mesmo você subir, continuamos conversando enquanto o ônibus não sai, espera, as maçãs ficam comigo, é muito importante, vou dizer tudo numa só frase, você vai ......... ............ ............. ............ .......... ........... ............. ............ ............ ............ ......... ........... ............ ............ sim, eu sei, eu vou escrever, não eu não vou escrever, mas é bom você botar um casaco, está esfriando tanto, depois, na estrada, olha, antes do ônibus partir eu quero te dizer uma porção de coisas, será que vai dar tempo? Escuta, não fecha a janela, está tudo definido aqui dentro, é só uma coisa, espera um pouco mais, depois você arruma as malas e as botas, fica tranqüila, esse velho não vai incomodar você, olha, eu ainda não disse tudo, e a culpa é única e exclusivamente sua, por que você fica sempre me interrompendo e me fazendo suspeitar que você não passa mesmo duma simples avenca? Eu preciso de muito silêncio e de muita concentração para dizer todas as coisas que eu tinha pra te dizer, olha, antes de você ir embora eu quero te dizer quê.

terça-feira, 24 de março de 2009

E eu queria te contar. Sei lá porquê. Essa hora que a gente se contava me dava força sabe? Me dava gostosinho na alma, me dava felicidade na vida. E sabe o quê? Descobri que o céu fica até bonitinho quando a gente tá cansada. Vi hoje e vi ontem. E a gente não viu isso, a gente não fez isso. A gente não fez tanta coisa. Mas a gente pode, deve e vai fazer tantas coisas mais a gente desejar. Mas o que dói mesmo é esse finalzinho de dia. A hora que eu valido um pouco da minha existência e dos meus sorrisos bobos com tua atenção. A hora que eu represento um pouco do meu mundo para a única platéia que me interessa no instante. A hora que eu até me irrito um pouco, de boba que eu sou porque faz parte. E então tudo isso que penso e vivo ganha um motivo maravilhoso e digno que é virar imagem no seu ouvido. Virar realidade. Porque passo o dia pensando nos teus talvezes, no que tu faz ou deixa de fazer se caso eu te ligasse de surpresa em horas inesperadas. Agora fico aqui me perguntando se eu existo mesmo. Porque se não me conto pra você, o que eu sou? Pra que serve? E ainda tem tuas músicas no mp3, ainda tem nossas coisas pelos cantos, ainda tem a minha espera por ti enquanto deveria estar dormindo. E te tenho, de alguma forma, também. E a cadeira balança com o vento lá fora e quando eu vou ver, sem ao menos perceber, tô chorando daquele jeito que faz mugidinhos sem um ombro pra escorrer as lágrimas. E ainda tem tudo isso que me prende a ti, tudo que nos une... Mas se eu perguntar porquê, corro o risco de calar sem resposta alguma. E sabe que tem sido melhor deixar a racionalidade do lado de lá da janela, pro vento nem trazer pra cá.
Não, ninguém entende nem nunca entenderá o que se passa aqui por dentro. Agradeço aos que tentam, mas quase ninguém entenderá. Mesmo.

Chega uma hora que cansa ser a culpa de (quase) tudo, cansa ser o motivo das brigas desnecessárias; cansa ser sempre o problema, o estorvo ou o nó emaranhado bem no meio. Chega uma hora que cansa respirar fundo e não dizer com todas as letras o que se quer; chega uma hora que cansa ser nova demais ou então não ser dona de sí, como mamãe sempre diz. Chega uma hora que cansa, simplesmente por cansar ou então por esperar que o motivo do cansaço cesse de um dia pro outro, como num passe de mágica. Chega uma hora que cansa não poder escolher isso ou aquilo, chega uma hora que simplesmente cansa de cansaço.

E tudo o que não cansa, faz falta - mas não chega a doer. Pra não ousar dizer que sorrisos, areia nos bolsos e lagartinhos que cabem na palma da mão perdem a cor na minha vida.

sexta-feira, 20 de março de 2009

dos laços & dos sonhos

O laço que amarra os sonhos na mente se desfaz devagarzinho ao acordar e, se penso na distância ou no tempo - quem sabe - quase que sempre me pego contendo as lágrimas dos olhos. Sinceramente, não são só pensamentos e essas não são só palavras. Mas de manhãzinha, depois que o despertador toca às seisemeia e eu me enrolo até às quinzeprassete na cama, é dificil não levar o pensamento pro arrepio ou pro frio na barriga sempre que te aproximas, ou pro ombro que secava os meus choros.
São pensamentos complicados para o horário, eu sei. Mas assim o são e nada disso me impede de pensar. De qualquer forma, me acostumei a levá-los comigo, sempre; me acostumei contigo. E se penso no quanto de mim ou de ti nós destinamos um para o outro, penso também em como tudo era quando nem dizíamos direito o que sentíamos, quando todas as certezas que temos hoje davam lugar à incertezas que, às vezes, não é só o passado que guarda. Quando penso nas heranças todas que cada pessoa nos deixa, lembro das muitas músicas que eu escutava naqueles dias frios, há espera de algo vindo de ti e que nem da minha parte transparecia.
O laço que amarra os sonhos na mente tem me levado a ti quase que todos os dias enquanto descanso os olhos no travesseiro de penas. Se penso na saudade que isso tudo me causa, talvez nem eu conseguisse suportar, talvez não conseguisse suportar se eu ou, muito menos, tu não fossemos nós mesmos. E se suporto consciente e incoscientemente é porque não é só uma parte minha que julga necessário que assim seja. Enquanto isso, deixo os laços e os meus sonhos exatamente como estão e como são. Por tempo indeterminado, né?

sexta-feira, 6 de março de 2009

Às vezes penso em dizer frases decoradas por aí, discursos programados por acolá ou meia dúzia de palavras de impacto que eu sei de côr. Na maioria das vezes que penso, desisto. Até hoje todas as minhas tentativas de causar alvoroço, estranhamento, boa ou má impressão em alguém foram frustradas, tornaram-se o oposto ou nada do que eu planejava. Acho que vem daí a minha facilidade de me transbordar em lágrimas sempre que falo o que sinto, sempre que ouço o que agride e sempre que me torno mais sensível que o normal duas semanas por mês, ou sempre que o coração aperta de mágoa, alegria, tristeza ou saudade. Mesmo assim, cada vez mais tenho a certeza que nunca convenci ninguém da minha pose de durona indelicada. Noto que, cada vez mais, a minha casca de durona se desfaz, mostrando que por dentro a nuvenzinha de algodão sempre chove. É, desisto. Nunca consegui ser ou parecer alguma coisa que não sou. Tenho lá culpa de não conseguir ser pela metade?

sábado, 3 de janeiro de 2009

Então, que seja doce. Repito todas as manhãs, ao abrir as janelas para deixar entrar o sol ou o cinza dos dias, bem assim: que seja doce. Quando há sol, e esse sol bate na minha cara amassada do sono ou da insônia, contemplando as partículas de poeira soltas no ar, feito um pequeno universo, repito sete vezes para dar sorte: que seja doce que seja doce que seja doce e assim por diante.
Mas, se alguém me perguntasse o que deverá ser doce, talvez não saiba responder. Tudo é tão vago como se não fosse nada.


[Caio Fernando Abreu - Os Dragões não Conhecem o Paraíso]