quinta-feira, 23 de outubro de 2008

(...)Tem sempre alguém achando um absurdo eu escrever sem usar os “lhes” e “los” e outras firulas. Meu português simples e direto e sem os mares assoviados que planam na planagem dos assovios que se perdem no trilho do trem assolado. Tem sempre alguém achando um absurdo eu não saber o que disse aquele filósofo ou poeta ou colunista de revista gringa. Tem sempre alguém me comparando com as histéricas “dadeiras”, com as discípulas dos beatniks que vivem “pra caralho, meu”, as doidinhas que largaram tudo pra “super viver a vida, cara”, as blogueiras que contam do dia com fotinhos para ilustrar, as traças que vivem de livros e drogas pra descobrir o que pensar da vida ou sei lá mais o quê de desgraça se pode encontrar por esses bares de gente que faz sarau ou simplesmente faz mais melhores amigos.
E achando um absurdo erros de português. E imperdoável eu não falar outras línguas. E que eu deveria conhecer mais o mundo. E que eu deveria falar dos outros. E que eu deveria falar menos de mim. E que eu deveria, deveria, deveria. Tem sempre alguém reclamando de ter virado personagem da minha vida. E reclamando de nunca ter virado nada. Tem sempre alguém reclamando que é muito triste, que é muito pesado, que é muito bobinho, que é escatológico, que é muito adolescente, que é muito puro, que tem muita bandalhera, que é velho demais pra minha idade, que sempre fala a mesma coisa, que não diz coisa com coisa, que incomoda, que não causa nada, que me expõe demais, que me protege, que diz tudo sobre mim, que não diz nada. Tem sempre alguém chegando e indo embora por causa de mim. Atraído, espantado, enojado, louco, excitado.(...)


Trecho Editado de: Mundo Pequeno | Tati Bernardi

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

O artista rabisca, na folha branca, a arte da vida e sem borracha erra os traços. Deixa as marcas do seu traçado, mas segue adiante. A vida segue em cada canto, em cada instante. De repente se repete em outras folhas brancas os mesmos traços, com erros diferentes dos de então, ou traços diferentes com rumos semelhantes. Com o passar do tempo se faz os mesmos erros em traços distintos. A folha branca, límpida, é a incerteza do futuro. Viver é rabiscar forte na folha branca. Eu rabisco forte e percebo que já não faria o traço da mesma forma. Passam-se os instantes, faz-se os traços e ficam as marcas. Assim como vão-se os anéis e ficam os dedos.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Primaveras de Outubro

amanheço mais mulher e menos menina a cada dia. amanhã amanheço minhas dezeseis primaveras e dezeseis invernos também, amanheço dezesseis verões, dezesseis carnavais e dezesseis outonos que vão e vêm. amanheço mil pássaros cantando e mil sóis se pondo, e mais da metade eu não vi. amanheço quase tudo alegria e (quase) todos os meus (des)amores.
amanheço as dezesseis velinhas dos tantos bolos que me fizeram doce nesses dezesseis aninhos. amanheço dezesseis mil sonhos, amanheço céus de blues e nuvens brancas pelos olhos, amanheço as mil e uma cores da camiseta listrada e do chinelo de borracha.

amanheço mais menina e menos mulher, mesmo estando mais perto dos vinte e mais longe da dos dez. não amanheço meio termo mas amanheço incertezas, sorrisos e palavras. amanheço passageira, mas inteira. amanheço minha longa estrada pouco andada, amanheço meus quilômetros a pé e todos os meus sonhos.amanheço meu subjetivo infinito em um metro e cinquenta e nove centímetros de altura. amanheço minha identidade maior que meu pé tamanho trinta e quatro.

amanheço dezesseis datas repetidas, dezesseis comemorações do acaso seguidas de mais mil e um milhão. amanheço um ano a mais, amanheço contagem regressiva, trezentos e cinquenta e cinco dias, mais uma vez. amanheço mais sincera, mais vivida, mais perdida e mais achada. amanheço mais um dia, outro dia, mais um mês, outro mês, outro ano, mais um ano.

- dezesseis anos, parabéns, feliz aniversário!

amanheço nesses meus quase dessezeis anos, não a soma dos meus anos, mas a medida das alegrias e tristezas da minha vida.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

depois do vendaval, a calmaria

Antes desse raiar de alegria eu queria ter outras vidas, falar outras línguas, gostar de outros gostos e detestar outras coisas. Agora, depois da minha própria aurora, quero a segurança de um abraço forte, a sinceridade de dizer meu nome sem tropeçar nas três sílabas e sem mentir a minha idade. Eu quero um despertar à três acordes ou uma cantiga de roda ao pé do ouvido, quero coisas jamais antes pensadas, jamais antes imaginadas. Quero a certeza do infinito enquanto dure, não a tristeza do 'pra sempre' assim como a ilusão do eterno.

Depois de algum tempo, finalmente, se entende do que valeu tanto sofrimento, tanta dor, tanto frio. Das perguntas sem respostas, essa era uma delas. Olho para o céu e depois de dois dias de céu cinza e chuvarada, o céu começa a limpar. Suspeito, eu diria, assim como as coisas que vêm se esclarecendo e tomando seu devido lugar.

Sim, se entende e se compreende. A dor é aceitável e justificável pra ver florescer tudo novamente. Em outras palavras, ou se aceita ou se abre mão.


Eu aceito a vida intensamente.

domingo, 12 de outubro de 2008

Uma pá de gente que não vale um centavo me pergunta sobre a veracidade do meu ser e dos meus sentimentos. Contenho a risada. Por mais irônico e hipócrita que seja, é deprimente. Pelo jeito, depois de um bom tempo, eu realmente aprendi que eu não preciso que acreditem em mim para que eu exista de verdade.

Mas eu sei até de cor os alguéns que eu me importo que acreditem na minha sinceridade. Sobre os outros, restam os meus indícios entre tanto faz, seilá e talvez. A minha sinceridade é fundamental, acreditem se quiserem.
O meu muito é, talvez, bem pouco. Acordar cedo em um domingo é sinal de que a madrugada não foi habitada por aquelas palavras e aqueles sorrisos que me fazem bem e que, quando ausentes, fazem falta, há um bom tempo. Enquanto minha mãe me fala das horas que eu não durmo, perder o sono pelos meus motivos é bem mais excitante do que deitar no meu travesseiro e sonhar todos os sonhos que cabem dentro dele. E, enquanto ela fala, eu lembro que essas horas, esses minutos são sim os melhores do dia.
O meu muito é, realmente, bem pouco. Não só pelas coisas realizáveis, mas também pelas minhas vontades. Por querer descobrir coisas mínimas do teu dia e compartilhar contigo coisas absurdas aos insensíveis; por querer te dar um abraço forte de bom dia e querer errar o ponto do teu café fraco com todos os meus dotes culinários. Enquanto minha lucidez se tele-transporta pra perto de ti segundos passam e refletem uma imensidão.
A tradução de imensidão, pra mim, são todos os detalhes, todas as imperfeições, todas as singularidades da tua pessoa. Mesmo quando eu acho tudo parecido demais comigo, tudo tão familiar e me assusto mesmo assim.
Hoje é Dia das Crianças, lembro de ti falando que era meu dia, mesmo eu não me sentindo nenhuma criança perto de ti. Lembro da mãe hoje de manhã cedo me abraçando e me entregando dois pacotinhos: dentro deles, chocolate e um livrinho. "Sorrir" dizia na capa, ela dizia que tinha achado a minha cara.
"Você sorria e falava comigo sobre coisa nenhuma e eu sentia que tinha esperado por isso tempo demais", eu e minha mania de bisbilhotar livros ao contrário, essa era a última página. E eu sentia, mais uma vez, que o meu muito, o que me faz muito feliz é realmente muito pouco. Muito simples, muito pouco mas muito para mim. Um universo que abrange de olhares e coisas-nenhumas que valem mais que mil palavras.

Não me arrependo e não trocaria essas alegrias por coisas poucas. Não mesmo.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

"Talvez sejam só fazes, ou nem isso. Talvez sejam só dias ruins, mesmo. Ou horas ruins. O único problema é que eu nunca sei lidar ou reagir a esses dias. Às vezes a distância mais mínima faz com que eu me sinta sem rumo, faz com que eu me sinta sem saber se tudo é do mesmo jeito e se até o que eu sinto continua igual. Na maioria das vezes até continua, sempre mais, sempre maior... Mas a idéia de não ter alguns sentimentos tão próximos e algumas presenças tão presentes em mim me assustam de uma forma inenarrável. (...)"


parte-começo da pseudo-carta que eu escrevi no meio da aula de física, sem controlar a mente e os olhos.